Subsídios para a compreensão do conflito entre Braga e Guimarães (10)

Sala do Teatro-Circo do príncipe Real, Porto (actual Teatro Sá da Bandeira). Imagem do Arquivo Municipal do Porto


Na sua edição de 22 de Maio de 1881, o jornal
O Formigueiro comentava o completo desprezo com que Braga pagou a desfeita da companhia do Teatro do Príncipe Real, quando, em Maio de 1881, chegou a Braga depois de ter passado por Guimarães:
  
O Pedantismo de Braga
Ou pedantismo ou pulhismo que escolham os bracarenses a quem nos vamos referir.
De há muito que ouvíamos falar em umas rivalidades entre Braga e Guimarães, e achávamo-las tão estúpidas que não as acreditávamos. Agora vemos que era verdade o que se dizia, por termos conhecimento do que se passou a semana passada com a companhia do teatro Príncipe Real, do Porto.
Incrível, na verdade!
Se fora em uma terra aonde não tivesse chegado a civilização, admitia; mas em Braga, que tem obrigação de se mostrar competentemente ilustrada e civilizada, é simplesmente estúpido!
Vamos ao facto e à rivalidade a que nos referimos:
A companhia do teatro Príncipe Real teve a ideia de fazer uma digressão pela província, principiando por Guimarães e terminando em Viana. Por isso deixou de atender à vaidade dos bracarenses e foi lá depois de ter estado nesta cidade. Foi o mesmo que passar à bofetada todos os habitantes da cidade augusta, porque estes tomaram isto em desfeita, e protestaram vingar-se terrivelmente dum tão inaudito crime!
E vingaram-se; e saciaram toda a sua sede de abutre; pagaram a desconsideração da companhia com o mais completo desprezo, deixando o teatro vazio no dia da récita, e obrigando os poucos espectadores a patear!
É uma desforra de selvagem, mas é desforra!
Agora pergunta-se: por que razão se pretende obrigar as companhias a visitar Braga primeiro que Guimarães?
Será porque a terra é mais civilizada?
Porque seja a terceira cidade do reino na ordem cronológica?
Porque os seus habitantes sejam mais dignos de consideração e respeito?
Porque a sua paga seja melhor e mais pontual do que a daqui?
Não pode ser por nada disto porque Braga nem é mais civilizada, nem tem habitantes mais respeitáveis, nem é mais honrada que Guimarães porque as companhias quando daqui saem vão sempre com o saldo das suas contas, entretanto que em Braga…
O motivo é outro a nosso ver, e esse resulta do pedantismo que por lá está inveterado.
Desgraçadamente hoje é tudo assim. Para se fazer figura é preciso ser pedante e pulha, sem se reparar que são à custa alheia os progressos que se vão fazendo e de que resulta essa condenável vaidade.
Que mais seria Braga do que Guimarães se não andasse constantemente a mendigar o auxílio dos seus pupilos para se engrandecer?
É asneira tentar amesquinhar-nos. Quem precisa do vizinho não pode nem deve indispor-se com ele, e Braga precisa de Guimarães mais do que Guimarães precisa de Braga.

O Formigueiro, 22 de Maio de 1881
[continua]

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1 Comentários

O Galaico disse…
Muito obrigado por estas preciosas e minuciosas descrições das origens desta "rivalidade".